26 agosto 2010

Exposição

Sair para rua, expor-se. Expor-se ao choque, ao contacto, ao encontro do diferente e seus ácidos corrosivos de certezas. O ambiente trabalhando nosso material aprendido armazenado, o subtil e o espesso. Impossível ir para a ilha sem se deixar tocar pelos nativos (vide Gauguin.). Encontros bons ou não, mas com a exposição, inevitáveis. Ele me chateava, eu me escondia quando podia, mas com poucas chances de sucesso. O cara da moto estava em todos lugares, tinha umas tremendas caixas de som na garupa e dava o bote sonoro assim, do nada, ninguém parecia intuir sua aproximação, ninguém dava sinal, o peso e instabilidade da motoca tornavam o bicho sorrateiro. Tava a gente lá, a comprar bife, e pah! *Tô ficando atoladinha, tô ficando atoladinha*, os nervos saiam pelos ouvidos como acontece com personagens de desenho animado quando atingidos por uma bigorna na cuca. Levando o filhinho para tomar sorvete, tô ficando atoladinha estacionava a moto deixando o som ligado, comprava seu cigarro e calmamente fumava um antes de partir, as mães agradeciam o estímulo que a letra martelada oferecia na perguntação dos pequenos. Propaganda com esse tema musical, não de motel, bordel, mas de supermercado! Depois os vendedores de churrasquinho acharam lindo e adotaram o hino. Radical, enlouquecida, peguei minhas gaiolas e passarinhos e desisti daquilo, não era vida! Escapei antes de *Chupa que é de uva* se tornasse epidemia, fazendo fundo, gritando em frente, nas novas propagandas da empresa de publicidade da pequena cidade. Agora em São Paulo, volta e meia vou pra Lapa, sinto saudades da humanidade despreocupada, da atmosfera de churrasquinho, de ver
a alegria nas caras suadas de trago na mão, meio escora mão-francesa ao longo das paredes dos bares. Das mulatas de cabelo cor de laranja que sorriem a toda corda, que gargalham espremidas como balões dentro de vestidos com grafismos gigantes de cores berrantes. Meu povo, meu malicioso e alegre povo! E a música, o admirável Tom Zé explica – resultado da junção das instintivas sabedorias da mistura das raças. Classificou de metarefrões microtonais e polisemióticos, para justificar-se ao ser questionado quando defendeu o estilo. Sou sua aluna, assim como declarou o gostosinho Jô Soares (já que estamos a exercer estas liberalidades), que o entrevistou. Para ver o vídeo da entrevista, clique no título da postagem.
Foto: Parque Fazenda da Àgua Branca- Joseph e os garnisés.

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